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terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Uma vida mais normal

Conheci um casal de professores que está a viver em Luanda há pelo menos um ano. Fomos jantar fora e verifiquei algo muito curioso em mim. Uma necessidade enorme de criar empatia e amizade com eles.
Sinto-me como um bêbedo que gosta de toda a gente, mas gosta mesmo (enquanto enrola a língua), mas mesmo.
Esta falta de socialização que estou a sofrer, faz-me perder qualquer timidez (como se eu alguma vez tivesse sido tímido) e ao mesmo tempo vejo-me a apreciar qualquer momento de lazer, por mais pequeno e insignificante que seja. Acho que devo parecer uma grávida, sou capaz de passar por três estados de humor num dia.
Desde a depressão profunda de manhã, à raiva da parte da tarde no trânsito, à boa disposição ao jantar.
Mas isto com o tempo vai melhorar, quando criar uma rede de amigos, começar a ir jogar à bola às segundas ou quintas, quando aos fins-de-semana pegar num grupo de pessoas e começarmos a explorar este país, cuja capital deprime mas o interior coloca em paz o espírito.
Já estou com melhor atitude face à minha vida aqui. Todas as pessoas, com quem tenho falado, dizem-me que no início a vida aqui é um inferno mas, lá mais para o meio, as coisas melhoram até que a tua normalidade, apesar de continuar a ser um caos aos olhos dos ocidentais, passa a ser "normal".

domingo, 16 de dezembro de 2007

Apenas um domingo

Hoje é domingo, a cidade de Luanda está calma. O sol já apareceu faz tempo e com ele o excessivo calor, não fossem os ares condicionados (que por acaso não gosto muito) derretiamos. Hoje está aquele calor.

Este fim de semana não fomos à praia nem andamos a fazer passeios malucos pelas terras vermelhas, típicas de África, ficámos simplesmente em casa de um amigo em Luanda a descansar e, está a saber tão bem.

Ontem tive com uma menina ao colo, de um ano sensivelmente, adormeceu comigo no sofá, foi uma sensação tão reconfortante, fez-me lembrar o quanto gosto desta terra e do quanto quero adoptar uma pequenina morena, senti-me bem novamente longe de todos aqueles que estão aqui unica exclusivamente para ganhar dinheiro, passando por cima de quem quer que seja.

Ontem também falei sobre o martírio que estamos a passar aqui (em termos profissionias) e verifiquei que toda a gente passa por isto, "aqui tens de lutar muito, mas depois é reconfortante" dizia o amigo "se gostas desta terra, não desistas porque pessoas que te queiram passar a perna existem aos milhares, marca a tua posição, faz a tua caminhada e vais ver que consegues. Os que não têm escrupulos caiem por si. Não desistas, pelo menos não agora". Palavras sábias? Talvez.... Não quero desistir, porque quem me conhece sabe que gosto disto, sabe que me privei de muitas coisas para estar aqui, sabe que mais tarde ou mais cedo esta vai ser a minha morada.

Sim, hoje sinto-me melhor amanhã não sei, porque aqui o ditado "cada dia é um dia" faz muito sentido.

Só há uma coisa que pela qual não estou muito satisfeita PORQUE RAIO NESTA TERRA NÃO EXISTEM PERSIANAS??? uma pessoa vê-se obrigada a acordar com as galinhas.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Tenho uma sensação esquisita...

Desde que cheguei aqui a minha vida é uma mar de sorte. Prometem coisas e cumprem com outras, bem ao jeito daqueles chatos telefonemas que nos fazem para casa a dizer: Acabou de ganhar "não sei o quê" e nós entusiasmados vamos ver a nossa nova prenda e acabamos por sair de lá bem tesos. Bem, aqui não são bem prendas, mas não anda longe....

AH e tal têm casa, ah e tal têm condições, TRETAS.... Não tens nada, tens apenas pessoas a empurrar umas para as outras as culpas.

Bom, eu prometi contar coisas boas sobre esta terra e vou contar, mas hoje apetece-me, com sinceridade, rebentar com isto, apanhar uma avião rumo a não sei onde ter com não sei quem... Ou melhor tentar perceber quem está mal.

Até porque aí por terras lusas acabei de perder o IGAPHE o dinheiro que o Estado dá aos jovens. Isto porque não consigo provar que em 2007 trabalhei e recebi, pois só IRS não chega e como estou em Angola, grande azar....... Ok ok são só boas notícias.

Bom, nem tudo é mau descobri que o meu primo de 5 anos já não tem um dente e que está ansioso por mostrar à familia no Natal como cresceu que fixe................................AHAHAHAHAHA eu nem vou lá estar no Natal para ver essse momento importante na vida dele...... Porra tenho mesmo azar.

Epa, bolas queria tanto contar uma cena boa, mas deixa ver, olha hoje foi a vez do Tiago vir a conduzir durante duas horas no trânsito, por isso dormi, isto foi a melhor coisa... Uau a minha vida é excitante aqui.

E jornalismo que é bom.? Nada. Eu já não sei se trabalho como jornalista ou saco de carga, ainda não percebi.

Bem caros amigos vou deixar-vos, porque pelo nível do meu descontentamento, a censura dentro de minutos entra aqui e prende-me ou mata-me, sei lá.

Até breve camaradas
Pablo

Nem todo o emigrante quer regressar

Em Angola está-se despreocupadamente na boa. Eu não estou, mas os nativos sim e quando me refiro a nativos, falo dos angolanos e dos estrangeiros que cá estão mas que não pensam em sair daqui.

Já conheci, dois angolanos, um a viver em Londres, membro da direcção da Sonangol e outro, a viver em Lisboa, apresentador conhecido de TV angolana que não trocavam os seus locais actuais por nenhum sítio de Angola.

Engraçado que falei com eles, algum tempo depois de ter vindo pela primeira vez a Angola, e não compreendi o porquê desta atitude. Principalmente, porque já visitei três ou quatro países da Europa e três ou quatro de África e penso sempre que só estou realmente bem no meu país.

Ainda pensei que fosse por terem passado muito tempo fora de Angola e, como tal, não tinham raízes angolanas mas nem é por isso. Ambos viajam frequentemente para cá, portanto até podiam ter, no mínimo, aquele sentimento afectivo dos turistas ou, sendo angolanos com família em Angola, podiam ter no coração aquela nostalgia que tanto caracteriza os emigrantes.

Resumindo, os laços afectivos que têm com o seu país de origem são nulos. Pior ainda, é o facto de ambos serem trabalhadores da nação angolana, pagos com o dinheiro do Estado mas fora do país, e mesmo assim não têm aquele sentimento forte de nacionalidade que tanto caracteriza o emigrante português, cabo-verdeano, até o americano e etc...

E esta conversa toda porquê?

Porque eu, na altura em que falei com estas duas pessoas, senti um certo "descrédito patriótico" da parte deles e isso fez-me confusão sobretudo vindo de quem está longe do seu país, como eles estão, e até me pareceu, em certa medida, uma atitude de alguém ingrato.

Faço aqui uma pausa para entenderem que eu estava a ter esta conversa com eles, uns meses após uma breve visita que eu tinha feito a Angola onde fiquei impressionado com o país.

Não compreendi a atitude deles mas agora compreendo. Mais tarde explico-vos porquê.

Diálogos

Em Luanda, história verídica:

Entrámos numa pastelaria e tivemos o seguinte diálogo:

Nós: -Duas torradas por favor!

Empregada: -Não tem torrada!

Nós: -Então são duas sandes!

Empregada: -Não tem sandes, não há pão!

Nós: -Então o que é que há para comer?

Empregada: -Só tem tosta.

Nós (sem questionarmos o facto de tosta ser pão tostado): -Então é uma de queijo (mas somos interrompidos).

Empregada: -Não tem queijo, só tem mista.

A partir deste momento, pedimos duas tostas mistas e não dissemos mais nada.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Eu também estou neste lugar L

Iniciei a minha escrita juntamente com o camarada Tiago (disse camarada porque aqui em Luanda toda a gente é camarada, coisas que ficaram das guerrilhas de tempos idos, coisas do partido vigente MPLA).

Nesta terra viemos fazer jornalismo.............. Até agora o projecto até parece interessante não fosse a desorganização normal de Angola, toda a gente quer fazer, toda a gente quer mandar, mas calma porquê fazer hoje quando se pode fazer amanhã? (se me lembro o ditado não era assim, mas aqui é).

E perguntam vocês o que é que tu e o Tiago estão aí a fazer??? Não faço ideia.......

Colocaram-nos em escritórios separados (ainda não percebi porquê) e ambos parecem mais barracas daquelas que se tivesse em Lisboa nem me atreveria a entrar. Não devia dizer isto mas digo. Mas enfim pagam e portanto logo se vê.

Aqui aprendo bem o valor de se esperar, de não ser apressada porque isso ,segundo eles, "fá male , bué male"( façam alguma pronuncia angolana ok?).

Enfim andamos a navegar porque não sabemos de nada, mas diz-se por aí que este grupo vai ser grande.

Pergunta: MAS BOLAS QUEM MANDA AQUI???

Resposta: "DAMA... TEM CALMA QUEM MANDA AQUI SÃO OS CHEFES"

Pergunta: QUAIS CHEFES??

Resposta: "ELES"

Fo...sssssssssssssssss

Isto é apenas o que se passa internamente nos nossos escritórios em que partilhamos o espaço com as moscas e mosquitos, porque os jornalistas angolanos vão lá quando têm tempo e os restantes portugueses ainda devem estar em Portugal... Fazem bem.

Tenho mais aventuras......Mas depois conto.

Parece que não gosto disto, mas gosto apenas este trabalho é surreal, porque aqui neste blogue irei contar coisas boas.....existem porque "África é terra mãe"

Pablo

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Uma rotina do caraças

Acordar às 6h, tomar banho, vestir-me e sair de casa às 6:30, atravessar a praia para fugir ao trânsito (lado a lado com os pescadores que puxam os barcos para a margem). Esta é a minha rotina diária desde que saí da casa de Luanda e passei a viver em Luanda-Sul.
Chegar ao trabalho 9:00, sim leram bem 9 horas. São duas horas e meia de caminho, para fazer 15 ou 20 km. Claro que quando chego ao trabalho estou com uma motivação tal que nem aguento.
Volta segunda circular, volta eixo-norte/sul, volta IC19. Eu agora era capaz de viver em Coimbra e ir todos os dias para Lisboa trabalhar, porque a fazer duas horas e meia de carro todos os dias, quase que podia morar na Mealhada e trabalhar no Porto, ou viver em Beja e trabalhar em Lisboa.
Nota-se que estou farto disto não é? É verdade, sim estou farto mas este relato nem é o pior.
Pois, esqueçam a loucura do trânsito, esqueçam as ruas sujas, esqueçam o facto de ninguém ser simpático ou educado quando vais às lojas ou quando perguntas alguma coisa na rua. Esqueçam isso tudo porque o que mais irrita, é tu dizeres qualquer coisa e mesmo que a pessoa não entenda, ela diz-te:
-Ya tá fixe.
E quando mais tarde perguntas:
-Então já fizeste/confirmaste/foste buscar/viste o que te pedi?
A resposta vai ser:
- AINDA!
E tu pensas, ainda?? Ele/ela não devia ter dito "ainda não" ou ainda não porque bláblá.. (resumindo a justificar-se)?
Não, nada disso a palavra AINDA, por si só, funciona como justificação para tudo, e se tal não for suficiente, e tu te estiveres a armar em ocidental e perguntares "mas ainda não porquê"?
A resposta vai ser e olhem que é de múltipla escolha:
1- Fiquei sem energia em casa, então não deu para ligar o computador...
2- Tive de ir a um funeral de um amigo/familiar...
3- Estava muito trânsito...
4- Não me atenderam o telemovel...
Ou então, realmente, quando és tu a ligar para quem está em falta contigo, essa pessoa não te vai atender o telemóvel, nem que tenhas acabado de falar com ela há 5 minutos.
Mas tá-se bem! Ontem vimos um morto na berma da estrada e ninguém parou o carro (só o polícia de trânsito é que estava lá ao pé a falar no rádio), mas não tem MAKA(problema)!
Ok eu gostava de fazer um texto romântico qualquer sobre África e a beleza do continente, a alegria das pessoas (ou não), mas este lugar "L" está-me a secar toda a consideração que tenho por este país. Ah... Sim! Não cuspas no prato onde comes...

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Sem noite

A noite de aqui não convida a ficar acordado, é escura, não tem pessoas na rua e mesmo o calor que se sente, não é suficiente para convidar a passear.
Lá estou eu com a minha visão demasiado ocidental. Então e nos musseques onde há os churrasquinhos à beira da estrada, a música constante na rua, as luzes dos kadongueiros de um lado para o outro, isso é muita agitação ou não?
Pronto, ok, eu não me divirto assim. Falta-me o cafezinho depois do jantar com os amigos ou namorada até à meia-noite. Falta-me não ter de fazer uma ginástica mental enorme para sair de casa de noite, porque as ruas são perigosas desde os loucos que andam na estrada (muitos em contra-mão) aos buracos no asfalto.
Há discotecas, há bares mas não sei explicar sinto-me fora do meu elemento. Espero que esta sensação mude brevemente, porque nunca fui de me prender e aqui parece que tenho de estar preso.
Mas a sério, não tomem a minha opinião como vossa, pois a primeira vez que estive cá adorei esta bandalheira.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Paixão / Motivação

Aqui os meus dias parecem curtos, deito-me cedo e levanto-me cedo, mas não tenho tempo para nada.Nesta cidade tudo passa por nós sem que tenhamos tempo para apreciar, não há, como já dei a entender, ingredientes especiais que me façam apaixonar por ela.
Se não me apaixonar por onde estou ou pelo que faço, fico com o coração vazio, inerte e inútil. Não te tenho a Ti para que o possa utilizar, e não tenho um Lugar que possa, por instantes, ocupá-lo (como por exemplo me acontece quando estou em Londres).
O truque de quem está longe das pessoas que ama, é projectar as energias e os sentimentos para outros interesses. Um Hobby, um trabalho ou um ambiente, qualquer coisa que dê para ocupar a mente e o coração.
Eu sou assim, empenho-me nas coisas que me apaixonam. Eu estou assim, pendurado e sem vontade de me esforçar por algo que não me está a dar prazer e por algo que me faz sentir cada vez mais vazio de sentimentos.
Até quando vou aguentar? Não sei, até porque a minha motivação é só uma. Aquela que segundo muita gente "makes the world go round"...

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

A Marginal e Baía de Luanda


Para que não pensem que Luanda é uma cidade sem beleza, vejam esta magnifica vista da Marginal.

domingo, 2 de dezembro de 2007

I'm dreaming of a white Christmas...

É Natal! As ruas estão resplandecentes com luzes e enfeites... Ou então não!
Esta é a única rua de Luanda que está enfeitada. Sim não há nenhuma árvore de Natal maior de África. Também de que raio é que eu estava à espera.

sábado, 1 de dezembro de 2007

Nem só de prédios e ruas se faz uma cidade

Luanda é uma cidade que viveu tempos de guerra, é como, orgulhosamente o Governo lhe chama, um canteiro de obras onde falta luz e água (de vez em quando) faltam ruas limpas, faltam placas com o nome das ruas, faltam sinais de trânsito, etc...
Mas neste canteiro há um problema que não dá para entender como vai ser resolvido. Chama-se trânsito. É impossível andar em Luanda sem apanhar um congestionamento qualquer, seja pelos Kandongueiros (toyotas hiace azuis e brancas utilizadas como autocarros) que páram em qualquer lado, seja pela incapacidade de quem conduz de dar prioridade a alguém.
Pela direita ou pela esquerda, em contra mão ou em cima do passeio, os Kandongueiros ocupam a via por completo.
Se o trânsito é assim tão mau, que tal andar a pé. Bem, para além dos imensos buracos que enchem as ruas de terra e de lama, há as toneladas de lixo espalhadas pelos passeios, que muitas vezes estão a arder lentamente de onde vem um cheiro impossível de aguentar. Depois temos as moscas gigantes, uma delas já me mordeu e deixou-me duas borbulhas enormes de onde tirei duas larvas. Há a poluição dos milhares de carros que percorrem a cidade, 99% não deve cumprir a norma euro3, já agora nem a euro1. Andar a pé é uma tentativa lenta de suicídio, para além de que o calor nos transforma em torneiras de suor.
Esta capital de cidade tem muito pouco. Não há esplanadas, nem miradouros, embora a cidade tenha uma vista porreira sobre a baía e, de noite, apenas algumas ruas estão iluminadas.
É uma cidade de arquitectura urbana mas de muito pouco espiríto citadino. Não sei se será porque a maioria das pessoas está mais preocupada com as suas necessidades básicas, mas essas pessoas moram sobretudo em Musseques (zona de barracas) portanto só vêm à cidade para trabalhar. Quem aqui mora é que deve estar só de passagem, como eu.
Sim esta é uma cidade hipócrita, há várias torres de escritórios em construção mas poucos prédios habitacionais a serem renovados. Este Lugar já teve a alcunha de Pérola de África mas é neste momento uma pálida imagem daquilo que foi, mas não culpem só a guerra...