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terça-feira, 4 de março de 2008

Normal, tudo normal

- Então Tiago estás bom?
- Eu estou, a Rita é que não. Apanhou malária
- Eh pá! Mas foi ao médico?
- Sim foi. Ia ficando surda por causa da medicação mas mudou-a (porque eu por acaso fiz uma amigo que é o melhor médico deste país, quando estive cá em 2005, que a viu) e pronto já está melhor.
- Então mas os médicos não lhe fizeram análises?
- Sim fizeram, mas estavam mais interessados em interná-la para sacar dinheiro à nossa empresa do que em tratá-la.
- Esses africanos pá. Tchi são mesmo uma loucura!
-Não pá. Este clínica privada é gerida por cubanos e brasileiros. Sabes aquele mito de que os cubanos têm um bom sistema de saúde? Pelos vistos os que vêm trabalhar para Angola nem são muito bons. Mas olha é assim a vida.
- Mas oh Tiago não pareces preocupado?
- Então já viste se eu me preocupasse com coisas pequenas. Tais como: ter um seguro de saúde decente, que afinal este é uma merda, pagarem-me a tempo e horas, ter dinheiro para beber um café pelo menos, ter telemóvel com saldo, fazer menos de uma hora e meia de trânsito para chegar ao trabalho. Se eu me preocupasse com estes promenores já me tinha ido embora.
- Então e agora não tens medo de apanhar malária?
- Eu não. Aliás, nem que o meu figado rebente, vou tomar Mephaquin durante o tempo todo que aqui estiver.
- Espero que as coisas corram melhor daqui para a frente!
- Sim hão de correr. A sério, hei de continuar a não ter água nos escritórios, volta e meia há de faltar luz, quem resolve estes problemas não me há de atender o telefone nem ligar de volta. Mas eu estou tranquilo, aliás aqui isto é tudo normal.
Se os angolanos se preocupassem com estes promenores, coitados. A taxa de suicídio deste país disparava para 90 por cento. Assim, em vez de morrerem de suicídio, morrem de serem tratados em clinicas assustadoras por estrangeiros mal formados. Mas é normal, tudo muito normal.

7 comentários:

ICONE disse...

Desculpa lá mas há coisas que não percebo. Se calhar sou eu que vejo as coisas de maneira diferente. O país aqui está mau para arranjar emprego...mas só não trabalha quem não quer. Há necessidade de as pessoas sujeitarem-se a esse tipo de vida, a correrem esses riscos!?? O que ganham com isso tudo!? DINHEIRO!!! Há coisas que o dinheiro não paga...
Puto espero que não leves a mal o comentário, mas só digo isto porque gosto de ti.

Luís

The Mask disse...

Ok é uma questão de dinheiro mas também de experiência e de vivência. Isto é mau mas entranha-se na gente, não te sei explicar.
Não é aqui que quero viver para sempre mas sempre é algo que ponho no currículo, é algo que fiz, é algo com que aprendi, é algo novo que conheci.
Muitas vezes só damos valor as coisas quando as perdemos, e o risco é sempre algo com que não me importo de viver mesmo pela profissão que escolhi (imagina se fosse reporter de guerra).
No que toca à saúde, ser "mal atendido" nos hospitais é uma das mais frequentes causas de morte em muitos paises do chamado primeiro mundo.
Não puto não levo a mal os teus comentários quero é que comentes mais :)

Unknown disse...

Concordo com o Luís na parte em que há coisas que o dinheiro não paga. Compreendo que é uma aventura, uma experiência única e inesquecível, e as coisas aqui estão realmente mal, mal, mal. Mas será que vale a pena esses sacrifícios? Será que essa experiência vai valer alguma coisa no vosso currículo quando voltarem e quiserem trabalhar cá?
É que já estão aí há tanto tempo e as coisas não há meio de se endireitarem...

Patalógika disse...

Sim vale a pena.
Quem sempre espera alcança.Agora as coisas estão a melhorar. E devo-te dizer (Já que fui eu que estive doente e muito mal)que certas experiências que para os de fora parecem inacreditáveis para os que a vivem são provas inequeciveis que, posso não colocar no currículo mas coloco na experiência de vida.
Não nos podemos esquecer que quem escolhe ser jornalista escolhe também correr riscos ou então, fica preso ao "jornalismo de secretária" para sempre.
Sim, temos medos, eu tive um grande susto, mas por inusitádo que possa parecer, não volto atrás com nada porque tive e vivi coisas muito boas e muito ricas. Cresci.E, mais do que tudo...SOU JORNALISTA.

Unknown disse...

Oh migo!!!Percebo-te tão desanimado...Vem-te embora!!Cám em Portugal não tens q te sujeitar a isso tudo! H´´a quem diga que ir para Angola é q está a dar , mas se calhar a tua empresa não cumpre essas condições. VOLTA!!!TÀS PERDOADO!!!
Atenção que a malária não se trata com antibióticos. Tenham cuidado como q tomam.

Unknown disse...

Rita, não podia ficar mais contente por saber que a tua escolha te faz feliz. Admiro-te porque não era capaz de fazer isso. A minha natureza não é assim. E não é pelo desconforto ou pelo medo das doenças. É porque sou demasiado apegada às pessoas de quem gosto. Sei que tenho perdido muitas oportunidades por isso, mas de que valia isso se ia estar sempre infeliz por estar afastada dos sítios e das pessoas que me fazem bem?

Talvez não tenha mesmo espírito de jornalista... ;)

Patalógika disse...

Cara amiga Paula

Nunca digas que não tens espírito para jornalista, porque o tens. Contigo aprendi muito.És uma jornalista e das boas...